10 de abril de 2025
25°C
  • CLIQUE AQUI (1)

Minas do Camaquã: da riqueza ao abandono

O vilarejo de Minas do Camaquã, que pertence ao município de Caçapava do Sul, já foi cheio de vida e de riquezas; entenda o que aconteceu por lá


Por Elias Bielaski Publicado 06/04/2025
Ouvir: 12:19
Minas do Camaquã com um lago, que surgiu depois da inundação da mina a céu aberto.
Minas do Camaquã conta com um lago, que surgiu depois da inundação da mina a céu aberto.

Você já ouviu falar nas Minas do Camaquã? Apesar do nome, esse vilarejo não pertence ao município de Camaquã, no Rio Grande do Sul. Na verdade, as duas localidades estão separadas por mais de 290 quilômetros, o que surpreende muitas pessoas à primeira vista.

Ambas, no entanto, compartilham a mesma origem etimológica: o Rio Camaquã, um dos cursos d’água mais importantes da região sul do estado. Por isso, a semelhança nos nomes pode gerar confusão — especialmente entre quem vive na própria cidade de Camaquã e nunca ouviu falar do vilarejo que leva o mesmo nome.

📱 Clique para receber notícias de graça pelo WhatsApp.

Esse desconhecimento, contudo, tem uma explicação. As Minas do Camaquã estão em processo de abandono há cerca de três décadas. 

O que antes foi uma cidade próspera, movida pela mineração do cobre, hoje sobrevive como um vilarejo quase deserto, mas ainda repleto de histórias e ruínas que resistem ao tempo.

Assim, conhecer as Minas do Camaquã é também revisitar um capítulo importante da mineração no Brasil e entender como um lugar que já movimentou milhões de dólares por ano acabou praticamente esquecido.

Onde ficam as Minas do Camaquã?

As Minas do Camaquã estão localizadas no Cerro do Martins, que integra o terceiro distrito de Caçapava do Sul, no interior do Rio Grande do Sul. 

Essa área histórica, marcada pela atividade mineral, fica a cerca de 259 quilômetros da capital, Porto Alegre, e a 197 quilômetros de Pelotas, que, por sua vez, é a principal cidade da Zona Sul gaúcha.

Atualmente, o local abriga cerca de 200 moradores. No entanto, nem sempre foi assim. Em décadas passadas, a vila pulsava com vida e trabalho, funcionando como uma cidade operária no coração do estado. 

Naquele período, graças à intensa atividade de extração e beneficiamento do cobre, a região movimentava milhões de dólares por ano.

Por consequência do encerramento das atividades mineradoras, a vila foi, aos poucos, esvaziada. 

Ainda assim, quem visita o local hoje encontra vestígios desse passado grandioso — o que, portanto, desperta o interesse de historiadores, turistas e entusiastas do patrimônio industrial.

A descoberta do cobre e o início da mineração

A trajetória das Minas do Camaquã teve início oficial em 1865, quando um morador da região, João Dias dos Santos Rosa, encontrou uma rocha de coloração azulada em sua propriedade. 

Curioso com a aparência do mineral, ele entregou a amostra a uma comitiva de Dom Pedro II, que passava por Caçapava do Sul naquele mesmo ano.

Posteriormente, a rocha foi enviada para análise por ingleses que atuavam na exploração de ouro em Lavras do Sul. O resultado foi surpreendente: tratava-se de cobre.

A partir dessa constatação, os ingleses decidiram arrendar as terras e iniciaram a primeira fase de extração mineral no local. A exploração era feita pela empresa The Rio Grande Gold Mining Limited.

Entrada da Galeria dos Ingleses nas Minas do Camaquã
Entrada da Galeria dos Ingleses. Foto: Reprodução

Embora já houvesse indícios da presença do cobre antes desse período, foi a partir de então que o interesse pela região aumentou consideravelmente. 

Com o tempo, dois depósitos ganharam destaque: a Mina Uruguai, que operava tanto a céu aberto quanto de forma subterrânea, e a Mina São Luiz, dedicada exclusivamente à lavra subterrânea.

Além disso, a localização estratégica das minas — cerca de 300 quilômetros do porto de Rio Grande — facilitava o transporte do minério. O concentrado de cobre extraído era enviado até a unidade da Caraíba Metais, localizada em Camaçari, na Bahia, para ser beneficiado.

Durante esse período inicial, o conhecimento geológico da região se expandiu rapidamente. Como resultado, novas frentes de lavra foram abertas, consolidando Minas do Camaquã como uma das áreas mais promissoras do Rio Grande do Sul para a mineração de cobre.

A chegada dos europeus e as mudanças

Em 1888, uma nova fase de extração teve início com a chegada de empresários alemães à região das Minas do Camaquã. Eles começaram a lavra de um filão de calcopirita e pirita na face norte da elevação onde, atualmente, está localizada a Mina São Luiz.

No entanto, apesar do potencial da jazida, o projeto alemão enfrentou sérias dificuldades. Por um lado, o alto custo do transporte encarecia a operação. Por outro, a queda no preço do cobre tornava o negócio inviável.

Como consequência, a mina foi vendida à Companhia Belga, com sede em Bruxelas e filial no Brasil. Com a nova gestão, iniciou-se uma fase de investimentos em infraestrutura. Entre as melhorias, destacam-se a construção de uma usina de beneficiamento e a implantação de uma barragem, que permitiram a retomada da lavra em 1901

Além disso, foi aberta a chamada Galeria Belga, no flanco oeste do cerro João Dias — localizada no lado oposto da galeria dos ingleses.

Durante esse curto período de atividade, a mina apresentou um expressivo desenvolvimento. O minério extraído continha até 30% de teor de cobre, o que possibilitava a exportação mensal de 90 a 100 toneladas para a Inglaterra. Embora a operação tenha dinamizado o tratamento do minério, novos obstáculos surgiram.

Em 1909, a Companhia Belga encerrou suas atividades. A decisão foi motivada por três fatores: a nova queda no preço do cobre, a descoberta de minas mais promissoras no Congo Belga e os elevados custos logísticos.

Mesmo após esse encerramento, as minas foram oficialmente registradas no Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM) em 1939. A extração, no entanto, só seria retomada em 1942, marcando o início da formação do vilarejo que, até hoje, leva o nome de Minas do Camaquã.

Assista a reportagem abaixo e conheça um pouco mais desta história:

O auge do vilarejo

Durante seu auge, as Minas do Camaquã viveram um momento único. Sob a administração de Francisco “Baby” Matarazzo Pignatari, empresário ítalo-brasileiro conhecido por seu perfil ousado e inovador, o vilarejo se transformou em uma espécie de microcosmo utópico.

Naquela época, cerca de 5 mil pessoas viviam na vila. Todos os moradores tinham acesso gratuito a moradia, água, luz e transporte, o que tornava a qualidade de vida bastante elevada para os padrões da época. 

Além disso, os atendimentos de saúde eram realizados em um hospital bem estruturado, com bloco cirúrgico e laboratório de exames.

Para o lazer, não faltavam opções. Havia um cinema com arquitetura no estilo saloon, que exibia os mesmos filmes que estreavam nas salas de Porto Alegre.

Ademais, eventos religiosos, churrascos comunitários, campeonatos de futebol e a tradicional festa do Dia do Trabalhador faziam parte da rotina dos moradores, sempre com apoio da Companhia Brasileira do Cobre (CBC). 

Já nos anos 1970, a empresa construiu um clube com piscina e sauna, ampliando ainda mais as opções de lazer da vila.

O fim do ciclo de prosperidade

Apesar dos anos de glória, o ciclo de prosperidade das Minas do Camaquã chegou ao fim em 1976, quando a atividade de mineração foi suspensa pela segunda vez. Na época, o impacto econômico foi significativo, já que a vila girava em torno da extração de cobre.

Contudo, nem tudo estava perdido. Graças a novas pesquisas geológicas bem-sucedidas, a mineração foi retomada em 1982. Diferentemente das fases anteriores, a operação passou a ser gerida pelos próprios funcionários da antiga Companhia Brasileira do Cobre (CBC), após o processo de privatização.

Ainda que houvesse empenho e dedicação por parte dos trabalhadores, o novo ciclo teve vida curta. Em 1996, a atividade foi definitivamente encerrada devido à exaustão das reservas conhecidas. Com isso, a vila passou a viver um lento processo de esvaziamento.

Alguns anos depois do fim da mineração, um fato inusitado ganhou destaque nacional: a cidade foi colocada à venda. Isso mesmo — todo o vilarejo foi anunciado no mercado, como forma de tentar atrair investimentos e dar novo destino ao local.

👉 Assista à reportagem veiculada no Jornal Nacional:

Como estão as Minas do Camaquã atualmente?

Desde o encerramento das atividades mineradoras, em 1996, o vilarejo de Minas do Camaquã passou a buscar alternativas para sobreviver. Como resultado, parte da comunidade apostou no turismo de aventura, aproveitando as paisagens naturais e os passivos deixados pela mineração.

Onde antes funcionavam minas de cobre, hoje é possível praticar atividades de lazer, como trilhas, esportes aquáticos na Barragem João Dias, além de visitas à chamada “cidade fantasma” — as ruínas da antiga área industrial. 

Também chama atenção o lago azul, com cerca de 150 metros de profundidade, formado em uma cratera de lavra a céu aberto.

Mesmo com a desativação de algumas atividades nos últimos anos, o vilarejo ainda oferece estrutura para quem deseja conhecê-lo. 

A antiga sede administrativa da mineração, por exemplo, abriga hoje a charmosa Pousada Bellamina. Além dela, há o tradicional Minas Hotel e a Pousada Minas Outdoor Sports, que recebem aventureiros e turistas.

Apesar do potencial, o turismo não se sustentou. Em 2017, a Fepam proibiu os mergulhos. No ano seguinte uma empresa do setor abandonou o local sem aviso. 

Ainda assim, há expectativa de retomada da mineração: a Nexa Resources, ex-Votorantim, demonstrou interesse na área, embora o projeto ainda dependa de licenciamento ambiental.

Assim, mesmo com ar de abandono, o vilarejo segue vivo. Assista o vídeo abaixo para entender como o local está atualmente:

Como chegar às Minas do Camaquã?

Embora esteja localizada em uma área remota, chegar às Minas do Camaquã é mais simples do que parece. 

Saindo de Porto Alegre, siga pela BR-116 em direção ao sul do estado. Logo depois, acesse a BR-290, que leva até a fronteira oeste do Rio Grande do Sul.

Continue até o quilômetro 317 da BR-290, o que representa aproximadamente 220 km desde a capital. Nesse ponto, entre na BR-153 com destino a Bagé — a sinalização é clara e fácil de identificar.

Siga pela BR-153 até o quilômetro 544, onde há um trevo sinalizado com a placa “Hotel Minas – 25 km”. Nesse local, entre na estrada de chão batido e percorra mais 25 km até chegar ao vilarejo de Minas do Camaquã.

Em resumo, a viagem total entre Porto Alegre e Minas do Camaquã é de cerca de 300 km, com um tempo estimado de quatro horas.

represetanção geográfica das Minas do Camaquã
Represetanção geográfica das Minas do Camaquã. Foto: Pinterest / Reprodução.

  • esporte banner desktop ok