Sampaoli diz que futebol é seu vício e explica distância de redes sociais
Filho de policial com uma dona de casa, o jovem Sampaoli ganhava dinheiro para investir na carreira de treinador


Antes mesmo de comandar um banco de reservas, atráves de uma partida de futebol, Jorge Luis Sampaoli Moya de 65 anos, batia ponto no Banco Pacífico, seu local de trabalho durante sua juventude na pequena cidade de Casilda, na Argentina.
Filho de policial com uma dona de casa, o jovem Sampaoli ganhava dinheiro para investir na carreira de treinador. Aos 65 anos, com passagens marcantes no Chile, bons trabalhos na Europa, no Santos e no Atlético-MG, mas frustrações na Seleção Argentina e no Flamengo, o treinador que escolheu o Rio de Janeiro para viver é um convicto antissocial.
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O seu mundo particular vai das análises políticas até longas reflexões de esquemas táticos e do ambiente do futebol, para ele muitas vezes contaminado por adversários internos.
Ficha técnica
Nome: Jorge Luis Sampaoli Moya
Nascimento: Casilda (Argentina), em 13 de março de 1960 (65 anos)
Carreira de treinador profissional: Juan Aurich, Sport Boys, Coronel Bolognesi, Sporting Cristal (todos no Peru); O´Higgins (Chile); Emelec (Equador); Universidad de Chile; Seleção do Chile; Sevilla, Seleção da Argentina; Santos, Atlético-MG, Olympique de Marselha, Flamengo e Rennes (França).
Títulos: Três nacionais pela Universidad de Chile (em 2011 Apertura e Clausura, em 2012 Apertura), Sul-Americana em 2011 e Copa Chile (2012/2013); Copa América 2015 pela seleção do Chile; Campeonto Mineiro em 2020.
Ge: Quando você surgiu, muito se falava de uma rebeldia que caracterizava os seus times. Você fez 65 anos no último dia 13. Essa rebeldia continua aí?
Sampaoli: Sim, mas não sei se rebeldia (é a palavra)… Eu acho que quando falamos de futebol, sim. A rebeldia tem a ver com defender uma ideia de equipes que sempre tenham um protagonismo desmedido, que pensem muito mais no gol do adversário do que no próprio. Naquela época (que surgi), era impossível que a La U de Chile (Universidad de Chile, campeã da Sul-Americana de 2011) ou a seleção do Chile pudesse ganhar do Brasil ou de alguma equipe brasileira. Fomos rompendo paradigmas, incutindo nos times de futebol essa agressividade que permite mudar a história.
Ge: Na sua biografia tem a passagem que você deu instruções aos jogadores em cima da árvore por ter sido expulso. Da viagem para a Europa quase sem dinheiro. Como foram esses tempos?
Sampaoli: Para mim, foi muito duro tornar-me treinador profissional. Quando cheguei tratei de romper alguns mitos criados. Foi um caminho muito longo de aprendizado, de curiosidade para estar muito preparado no dia em que tivesse a chance de treinar, que era mínima, na verdade. Eu nasci numa cidade muito pequena (Casilda) na Argentina, era muito difícil competir com treinadores de Buenos Aires, de Rosário, então tive que começar minha carreira no Peru.
Ge: Você era jovem nos tempos de ditadura argentina e volta e meia a política entra no seu discurso. Como esses tempos te influenciaram?
Sampaoli: Muita coisa. Minha adolescência foi na ditadura, éramos muitos e nos juntávamos contra a ditadura. Depois houve a Guerra das Malvinas, um monte de coisa que nós, como argentinos, e no meu caso em particular, nos formamos assim. Foi um tempo muito difícil, horrível. Éramos muito perseguidos naquela época da ditadura. Tive amigos e gente conhecida que desapareceu, mas isso foi nos formando. Nos juntávamos para pensar maneiras de mudar essa história. Depois tratei de levar essa rebeldia para os meus times.
Ge: O futebol é um ambiente predominantemente de pessoas menos abastadas e é dominado por pessoas de direita. Como entende isso?
Sampaoli: A direita, inclusive, na atualidade, cresce em todo o mundo, praticamente conduz o mundo atual. Inclusive, no meu país (Argentina), por exemplo. Quando falamos de direita e esquerda, eu sempre pensei nisto como visão de mundo em busca de mais igualdade. Ver gente dormindo nas ruas, como eu vi no Brasil, em Santos, em Belo Horizonte, aqui no Rio de Janeiro… Estou muito mais perto desse povo. Porque eu me criei assim, conheço como é ser uma criança numa casa em que o pai não consegue (dinheiro) o suficiente para chegar ao fim do mês e, então, sou mais daquele povo ou do menino que tem dificuldades de comprar uma sandália ou uma chuteira para jogar futebol. Sempre estive mais perto desses lugares, por isso me identifico mais com isso. Mas é difícil para esse povo que tem governos que só pensam na economia. Nós pensamos muito mais na humanidade e, nesse sentido, acredito que seja muito bom que o Brasil tenha esse governo de agora. Eu respeito muito o presidente desse país (Luiz Inácio Lula da Silva) e gosto muito que ele seja o presidente desse país. Mas vejo claramente que a direita está conduzindo o mundo. Hoje temos guerras, invasões, podemos estar muito perto de outra guerra mundial. É muito preocupante. Vemos o que acontece na Faixa de Gaza. Ninguém consegue imaginar porque estamos aqui, não imaginamos o que está acontecendo lá, se fosse aqui seria muito doloroso.
Ge: Você vive no Brasil há um tempo. Você percebe a polarização que existe no Brasil nesse campo?
Sampaoli: Sim, claro. Na Argentina é muito parecido. Por isso digo que seria bom que houvesse uma correlação, que houvesse tempo para a possibilidade de algum governo se estabelecer para estabilizar o país. Porque há mudanças em todo o momento. Vai para a direita, para a esquerda, para direita e não existe orientação clara para uma direção, um caminho. A verdade é quem sofre é o povo com esse tipo de mudança, porque são muito abruptas. Se muda governo a cada quatro anos e quem sofre mais é quem menos tem.
Ge: Como sua visão de mundo se relaciona com o futebol que você busca? Que emoções te atraem num jogo de futebol?
Sampaoli: Sempre quero que um time ganhe. Meu lado competitivo não me deixa ser neutro. Não consigo separar. Mas sinto que o futebol como arte ou como alegria de se jogar perdeu muito. Vejo muitos jogos, mas pouco futebol. Os jogadores hoje não se divertem jogando. Ao contrário, sofrem. É mais um combate do que um jogo.
Sampaoli: No Brasil, a gente vê, por exemplo, a aparição de um Estevão, outros jogadores que são criativos, têm liberdade até que chegue uma estrutura de obrigações. Dizem que o jogador tem que fazer isso, fazer aquilo. Eu vejo o Savinho no Manchester City, que nós fizemos estrear no Atlético-MG, e nos sentimos orgulhosos de ver esse menino desfrutando do jogo. Ele joga livre. No Brasil, eu acho que a excessiva automatização do jogo faz com que os talentos fiquem um pouco controlados. Você imagina Ronaldo ou Romario? Ninguém podia dizer o que eles tinham que fazer. Faziam por si só e eram o que eram. Agora fomos ao outro extremo. Aqui todo mundo corre, todo mundo tem obrigação, mas se tirou a liberdade do jogador de expressar a arte natural que sempre tiveram.
Ge: A busca por resultados imediatos influi nesse processo que você critica?
Sampaoli: O Brasil era inalcançável e hoje a gente vê competir contra equipes de Bolívia ou do Peru ou do Chile, com qualquer equipe, e são jogos parelhos. Como são parelhos? Impossível! A alegria do futebol brasileiro se perdeu. Agora é urgência, é obrigação. Você tem que ganhar todos os jogos ou te insultam, te agridem. O jogador não é livre, na realidade, então perde autonomia, perde criatividade. Porque tem a obrigação de ganhar todos os jogos, de correr mais do que jogar. Para mim, o jogo se transformou em outra coisa e isso prejudicou o Brasil também por esse lado. Eu te diria que agora são todos iguais, somos todos iguais.
Ge: Há como corrigir essa rota?
Sampaoli: É um pouco mais difícil. Por exemplo, no Santos em 2019, nós conseguimos. Tentamos ter um time que não tinha grandes salários, mas armamos. Em Belo Horizonte, funcionou. Inclusive no início do Flamengo. Mas depois entra a política, o negócio, as coisas estão por cima do treinador e de um projeto esportivo. Em futebol tem a urgência de mudar em cada janela de transferências 12 ou 10 jogadores. Tudo vai mudando todo o tempo e não se consegue evoluir. Não se consegue conscientizar para que o time tenha basicamente uma harmonia. Todo o tempo acontece alguma coisa, muito tumulto, muito ruido, dos torcedores, dos meios de comunicação, dos donos que não conhecem de futebol, mas conhecem do negócio. Para o treinador, não é incomum, nem no mundo, mas no Brasil principalmente, que se mude de treinador e se mude os processos em todo o tempo.
Ge: Por sinal, muitas vezes se noticiou que você pedia muitas contratações. Qual o limite entre a busca por atender ao treinador e o treinador se adaptar ao que o clube pode oferecer?
Sampaoli: Bom, é como quando você está no colégio e tem aprendizado por etapas. Nós temos que saber que temos que ir progressivamente. O maior problema para chegar ao estilo de jogo que nós queremos é o medo. Quando você tem medo, não pode fazer disso uma equipe livre. No Flamengo, por exemplo, aconteceu que sempre falavam de 2019. “Ah, porque em 2019 jogávamos dessa forma”. Bom, em 2019 era assim, mas estamos em 2023. Vamos jogar dessa maneira porque nós pensamos assim. Quando você entra numa disputa com o jogador, você tem que convencê-lo e o meio de convencer são os jogos. Por isso que digo que pegar um time na metade do caminho é muito mais complexo para desenvolver ideias. Nem falo do jogo posicional, falo do protagonismo do jogo. Queremos jogar 80, 90 minutos no campo adversário. Vamos rodear o campo adversário, vamos colocá-los lá dentro. Mas aí você deixa muito espaço nas costas e você precisa de zagueiros rápidos, um monte de coisas que eu não negocio. Eu posso negociar que o jogador vá evoluindo em seus movimentos, mas no protagonismo não. Mas muitos jogadores não têm esse interesse do protagonismo. Ele quer que outros sejam protagonistas. Esperamos aqui, roubamos a bola e corremos.
Ge: Você falou de liberdade aos jogadores. Aqui no Brasil, convencionou-se pensar no jogo de posição, do qual você é adepto, como uma imposição de limites a essa liberdade. Não é uma contradição?
Sampaoli: O único livro de futebol que existe é o do regulamento. O regulamento me diz que tenho 100 metros para cima e 68 metros para o lado e a partir daí preciso ter uma distribuição espacial que reduza os espaços para recuperar a bola se não estou com ela. E tenho que saber que vou me movimentar muito. Sempre explico aos jogadores que nós temos que saber onde estamos de memória. Quando a bola chegar temos que tomar a decisão de ir até uma profundidade do campo que nos permita atacar a última linha muito rápido para que o rival não se recomponha. Na última etapa no Flamengo tivemos muita dificuldade com isso, porque era uma equipe que se mexia muito e quando duas equipes se movem muito para atacar e recuperar a bola há muito contato. Eu queria que jogadores mais destacados como Arrascaeta, Gerson otimizassem o tempo para terem a clareza de atacar a última linha defensiva. Não tivemos muito tempo para construir essa equipe, o contrário do Atlético, até pelo momento da pandemia, ou do Santos, quando foi muito mais fácil, escolhemos os jogadores e liberamos a criatividade. Demos mais tempo a Soteldo, Marinho, formamos, por exemplo, com Sasha pelo centro.
Ge: Mas entende que é falsa a oposição entre o jogo de posição e a autonomia do jogador?
Sampaoli: Eu quero que o meu jogador, aquele mais talentoso ou o ponta que tem que escapar do lateral, tenha tempo. Que não receba de costas, por exemplo, que tenha a possibilidade de escolher o melhor ataque. Para isso precisamos de jogadores que interpretem os espaços. Tive dificuldades (no processo) com Gerson no Olympique, no início, mas depois foi decisivo. Ao Gerson eu devo, inclusive, nosso sucesso na França. Foi um jogador que interpretou todos os tempos de ataque. Quando tinha tempo, era contundente. Depois, volta ao Brasil, volta a jogar de outra forma e quando chegamos aqui vimos Gerson jogando de volante e nós voltamos a colocá-lo em outro lugar, com um time diferente no meio do campeonato. Os jogadores do Flamengo tinham muita capacidade, mas acontece que não tinham a educação para isso. Precisavam de um pouquinho mais de tempo.
Ge: Você vê Gerson como jogador mais perto da área rival?
Sampaoli: Sim, eu sempre discutia isso com ele. Para mim, ele é muito mais produtivo chegando na área, pensando mais no gol adversário do que na organização. De nível muito alto.
Ge: Você entende que o seu relacionamento com as pessoas é um ponto que você precisa melhorar para o seu trabalho?
Sampaoli: Sim, acredito que sim. Inclusive para consolidar uma ideia no meio do caminho. Quando houve processos muito curtos, no Sevilla e no Rennes, inclusive no Flamengo, nós não conseguimos convencer o clube de fazer modificação, uma cirurgia rápida. Chegamos ao Flamengo com o time em crise. Haviam tirado o treinador, as coisas não estavam funcionando, vinham de perder na Libertadores, perderam para o Fluminense (no Carioca). Era necessário fazer uma cirurgia (ruptura). E, bom, alguém te contrata e diz “vai acontecer isso”. Depois, não acontece e quando não se cumpre o que me prometem, normalmente trato de cortar o vínculo. Também acho que é uma coisa para melhorar como treinador, entender que isto é um negócio, que não é mais um jogo, é um negócio. Às vezes você incomoda este negócio. Se você quer ficar, tem que ser uma pessoa que consiga mudar algumas coisas. Inclusive saber como chegar aos jogadores. Hoje os jogadores não gostam tanto. Estão tão oprimidos, tão incômodos que se você chegar todo dia para conversar, com vídeos, com coisas para saber como melhorar… Eles precisam ter a capacidade de se liberar de todo esse mundo que os rodeia para serem felizes dentro do campo.
Ge: É também um papel do treinador?
Sampaoli: Isso é o mais difícil hoje. O jogador precisa saber que ali é um lugar de prazer. Mas a profissão de treinador está totalmente depreciada. Não se respeitam os treinadores. Conheço um monte de treinadores que trabalham muitíssimas horas por dia e que se dedicam muito tempo e depois, imagina só, chega alguém que não entende de futebol e lhe diz o que tem que fazer ou não a um profissional. Então é claro que para nós, como treinadores, temos que saber o que temos que modificar para o respeito que precisa um treinador profissional comum. Que se dedicou, que se preparou e estudou muito. Há um monte de situações que deveriam mudar para que o treinador tenha respeito e que depois o dirigente veja, no final do processo, o que modificar. Mas não cortar processos o tempo todo.
Ge: Voltando ao tema das relações. Muito se falou que você teve atritos em clubes. Refletiu sobre isso? Concorda com alguns pontos?
Ge: Sim, concordo, sempre reflito sobre mim, até porque é a única maneira de melhorar. Sou uma pessoa muito direta e às vezes isso joga contra mim. Porque falo diretamente com uma pessoa o que tenho que falar e digo o que penso. Então às vezes isso não cai bem e a pessoa não gosta muito. Mas, sinceramente, eu não tive muitos problemas (nesse sentido). Porque eu falo somente de futebol. Não falo de outras coisas (com as pessoas nos clubes). Eu falo de jogar bem. A única coisa que eu não gosto é quando meu time não joga um bom futebol. Quando no Brasil se festeja que um jogador dê um chutão para fora. E gritam como um gol. É o Brasil! Tem que festejar um chapéu, um drible, uma coisa que fazia Ronaldinho. Como que vou querer que Ronaldinho corra, para quê? Eu quero que ele jogue.
Ge: Você fala de resgatar um sentimento de amador?
Sampaoli: Sim, claro. Tem que lutar por isso. Veja o Neymar agora no Santos. Voltou ao seu clube, sentiu que tem a possibilidade de jogar e se divertir num campo de jogo com sua camisa. Eu valorizo porque é como um sentimento amador. Tomara que desfrute, que volte a ser o Neymar de sempre. Vemos muitos jogadores voltando a jogar em seus clubes (formadores), Thiago Silva e outros. Muitos decidiram vir jogar aqui tem a ver com isso. Com sentimento.
Ge: Ao mesmo tempo é difícil encontrar esse equilíbrio entre o paternalismo das relações no futebol e esse sentimento de amadorismo?
Sampaoli: É difícil, é muito difícil. Sinceramente, pela minha maneira de sentir e de falar por todo o tempo do jogo, quero que tenhamos um só idioma, o futebol. O Neymar precisa voltar a ser aquele garoto que podia ter sido tranquilamente o melhor do mundo. Tinha todas as condições. Encontrou aqui um lugar onde as pessoas o amam muito. Ele precisa desse carinho para mudar sua história. Tem muito tempo que não joga, teve uma lesão muito dura. Eu desejo que Neymar volte a ser esse jogador, porque há muito poucos jogadores nos dias de hoje como Neymar. É preciso cuidá-lo. Inclusive, acho que não veremos mais jogadores assim. Antes, Argentina, Brasil, ainda mais o Brasil, formavam jogadores que realmente eram incríveis. Agora, o estereótipo do jogador atual é diferente.
Ge: Por quê?
Sampaoli: Em lugares como o Marrocos, por exemplo, você vê muitos bons jogadores ou vê aquilo que só acontecia no Brasil e na Argentina. A Argentina tem três dos cinco melhores do mundo: Di Stéfano, Messi e Maradona. Agora eu acho que vai passar muito tempo para que se repita. Porque acabou o “potrero” (campo de várzea ou de rua). Os garotos hoje jogam outra coisa. Não jogam bola na rua. Aqui também há outras distrações. Por isso não acho que voltem aqueles tempos. Nunca mais. O futebol virou outra coisa, se robotizou um pouco. Quando se robotiza, você perde humanidade, se perde sensações criativas, artísticas. Antes, imagina, que os garotos jogavam bola desde a hora que acordavam até a hora que dormiam. Agora não tem mais os campos de rua. Hoje, temos celulares.
Ge: Quem são os outros dois melhores do mundo da sua lista de cinco?
Sampaoli: Pelé e Cruyff.
Ge: Você já se definiu como um antissocial natural. Ainda é assim? Quanto isso te ajuda ou atrapalha?
Sampaoli: Sim. Não me ajuda, mas isso é mais forte do que eu. Sou uma pessoa que não tenho muitos vínculos com a sociedade, porque me parece que nesse momento temos uma sociedade muito confusa, inclusive muito doente. Você vai a um estádio de futebol sendo neutro e vou embora porque tem insultos, agressão. E vão crianças, um monte de mulheres, famílias. As massas se transformam num estádio de futebol. Há um nível de agressividade muito alto e então isso me incomoda. Por isso não vou a um estádio, eu gosto muito de ver futebol no estádio, mas vejo pela TV. Presencialmente o jogo é muito diferente. Para os treinadores, e eu sempre digo que o que mais aprendi é vendo partidas no estádio, é difícil que isso tudo não me afete socialmente. A conduta daqueles que vão ver a partida de futebol, que olham o telefone a todo instante, que insultam a todo instante.
Ge: Você acha que essa reações também têm a ver com a desigualdade social que existe? A pessoa olha o jogador como aquele que ganha milhões e ele sofre para pagar ingresso, para se sustentar.
Sampaoli: Eu acho que sim, tem a ver com isso. A desigualdade cresceu tanto e acho que virou um circo romano quente, porque todos estão assim: baixa o polegar. Ou levanta o polegar. Vão para isso. Não considero bom que alguém vá ao estádio insultar um jogador. Isso é terrível. Eu acho que hoje, inclusive, isso se polarizou e cresceu mais. Por isso, o jogador, quando vê que se não ganha vai ser insultado ou se não ele, vai ser insultado o treinador, então (pensa) que insultem ao treinador. E assim vamos todos nos separando. “Se não me insultam, eu não digo nada”. É um mundo que vai te separando, não unificamos critérios. Não dizemos: “bom, veja, vamos por esse caminho. A gente vai ter dificuldades, mas vamos juntos”. Isso não acontece. Ou seja, o jogador vai por um lado, o treinador fica totalmente exposto muitas vezes. Eu acho que no futebol há muita hipocrisia. Eu digo sempre: a única coisa que une os jogadores é o gol. Aquele abraço de gol. Bom, então vamos fazer mais gols. Vamos nos abraçar mais. Vamos nos amar um pouco mais. Vamos fazer muitos gols porque, na verdade, é nesse momento que todos nos abraçamos. Hoje, na sociedade, que alguém abrace outra pessoa é muito difícil. Porque tudo é muito dinâmico, muito rápido e não se desfruta. Se você é campeão hoje, amanhã já se esqueceu. Amanhã você perde um amistoso e tem um problema. É muito difícil.
Ge: Mudando um pouco de tema. Você ainda lembra daquela bola no travessão do Pinilla aqui no Brasil?
Sampaoli: Sim, claro, sempre me lembro. Esse jogo foi incrível. A gente tinha uma equipe muito valente, aquele nosso Chile. Inclusive, Medel jogou aquela partida com estiramento. E era um Brasil que não tinha respostas e que estava muito desconfortável naquela Copa. Acabou mal porque já vinham sofrendo. Eu acho que o melhor que podia ter acontecido ao Brasil, era que a gente fizesse aquele gol que bateu no travessão. Teria sido melhor, pois estavam sofrendo de verdade. O Brasil não sabia ainda que teria sido melhor assim… Claro (risos). Teria sido melhor apagar o capítulo do 7 a 1, que foi mais doloroso.
Ge: Esse sofrimento é por fazer esforço para jogar ou você fala da pressão que existia no Brasil para ganhar aquela Copa?
Sampaoli: Sim, por isso (pressão). Vivi isso na Argentina. Eu acho que quando você está condenado antes, é muito difícil que se possa escapar dessa condenação e essa seleção (do Brasil) era muito boa, mas não era livre. Estava totalmente oprimida.
Ge: Na Argentina você assume no final das Elimintórias, fora da zona de classificação. O seu jeito de comandar era indicado para o que o momento pedia? Você faria diferente?
Sampaoli: Sim, faria diferente. Às vezes você se equivoca mais do que acerta. Normalmente chegamos num lugar com certas crises. Então quando existe uma crise você tem a oportunidade de revertê-la. Mas ter o diagnóstico e saber como fazer é que é o problema. Porque não é somente mudar situações. Tem a ver com a condenação que geram as massas, é muito difícil. Então, você toma decisões equivocadas e e termina sendo parte do problema ou o aprofundando. Eu acho que aconteceu isso ali.
Ge: O Messi de 2022 parecia mais cômodo para jogar do que o Messi de 2018, não te parece?
Sampaoli: Eu acho que a comodidade do Leo (Messi) no Mundial do Catar tem a ver também com uma geração de jogadores que chegaram. Tinham muito mais potencial para competir do que nós tivemos antes. Messi tinha decidido antes até deixar a seleção argentina porque era um fardo muito grande. Ele ficou livre (depois) e quando se sente assim, se permite sonhar, tem gana e faz a diferença na Argentina ou no clube onde joga. Para mim é o melhor da história, até pela longevidade da sua carreira. Ele é o melhor e é há muito tempo é o melhor.
Ge: Aquela famosa foto do Mascherano na Copa com você chamou muito a atenção. Pareceu isolamento do grupo contigo. O que você diz sobre isso?
Sampaoli: Nessa foto, eu falava com Mascherano algo de futebol. Não era algo… sinceramente, quando entramos numa situação dessas e como comissão técnica a gente dedica muito tempo a falar com os jogadores, era a oportunidade de dirigir a seleção do meu país. Mas, com certeza, erramos o diagnóstico, erramos a solução do que estava acontecendo e é isso. Não vejo muito mais do que isso. Pela pressa que tínhamos, a urgência, porque estávamos fora da zona de classificação para a Copa, estávamos com toda a pressão de um país em cima, então foi tudo muito complicado. E quando as coisas estão assim tem que ter nível de eficiência muito grande para sair desse lugar.
Ge: A gente viu muito aqui no Brasil treinadores tendo problemas de saúde, de ordem física e mental. Você tem esse tipo de acompanhamento psicológico, você se cuida por esse aspecto também?
Sampaoli: Sim, porque (o trabalho) é complexo, você está sendo observado a todo tempo. Inclusive, quando você vai bem, eu tenho muito mais cuidado da minha saúde mental do que quando as coisas vão mal. Evidentemente já passei por muitas coisas boas no futebol, mas outras não tanto. Nas derrotas sou muito mais reflexivo. Eu sei que muitas vezes não controlo tudo, não tenho a capacidade de ser responsável nem por ganhar nem de perder. Há um monte de fatores que o treinador não controla.
Ge: Você saiu do Rennes há pouco tempo, uma experiência à brasileira, com poucos jogos e uma despedida precoce. O que aconteceu lá?
Sampaoli: Foi uma experiência desse tipo. Você chega num clube com a expectativa de mudar as coisas, de fazer coisas importantes. O dono do clube é uma pessoa muito importante na França e, sinceramente, não fui correspondido nas expectativas que tinha em relação ao mercado (de jogadores). O diretor esportivo decidiu fazer um mercado que não tinha relação com o que necessitávamos. Preferimos cortar o vínculo. Eu não poderia representar uma equipe em que eu não tinha escolhido os jogadores no mercado de inverno. Inclusive, falamos de jogadores que já atuaram conosco para mudar a história mais fácil, mas não fomos muito escutados. Então o melhor é não seguir. A equipe tinha encontrado muito boas respostas futebolísticas num curto prazo, jogamos bem em alguns jogos. Podia ter gerado um processo de sucesso, de longo tempo, mas quando a gente se choca com ideias diferentes, o melhor é a separação.
Ge: No início da sua carreira você era muito identificado com as ideias de Marcelo Bielsa. Mas com o tempo você migrou para o jogo de posição. Qual foi o ponto de ruptura nessa sua filosofia do jogo?
Sampaoli: Porque eu pensei o seguinte: tínhamos conseguido tudo com a seleção chilena, que foi campeã da Copa América, com a La U de Chile, ganhamos cinco títulos. Mas eu precisava evoluir. Parece que o que estávamos fazendo tinha um teto, um limite. Queria dar evolução, sem perder o foco no ataque. O ataque tinha que ser de outra forma. E começamos, como comissão técnica, a evoluir com o estudo de saída, da construção de jogo, de trocar muitos passes no campo adversário, e essa construção nos fez dar um passo diferente em nosso pensamento. E fomos construindo para que isso acontecesse.
Ge: Os times do Guardiola, a sua amizade com Juanma Lillo, que depois você levou ao Sevilla, te influenciaram?
Sampaoli: Sim, sim, tiveram muita influência. Os times do Guardiola, ter Lillo comigo no Sevilla, que era um time que jogava de maneira extraordinária, foram pessoas que vão, por sua capacidade de leitura, te orientando aos porquês (das mudanças). Por isso digo que um treinador precisa de uma construção. Ali estão a inquietude, a curiosidade. Sempre fui muito curioso. Cheguei a Lillo por esse sentido, porque não o conhecia. É a pessoa que melhor conhece o jogo de posição. Fui a Barcelona, falei com gente do clube e aí tirava conclusões de acordo com o que via ou do que falavam e de acordo com o que sentia. Eu me senti bastante identificado que eu poderia desenvolver esse tipo de futebol.
Ge: A temporada atual do City levantou uma questão: o jogo de posição está muito estudado? Precisa evoluir ou se adaptar?
Sampaoli: Eu acho que sim, como tudo na vida. Você tem uma forma, uma forma que teve êxito com o City anteriormente, agora você vê muito volume defensivo, bloco baixo, muitas transições muito rápidas. Eu acho, inclusive, que também com a marcação individual com jogadores fisicamente muitos aptos. Claro que agora tem que buscar recursos que gerem que isso que está totalmente controlado possa voltar a superar o adversário. E isso é entender que os processos de eliminação dos oponentes terão que ser estrategicamente posicionais de outra forma. Tudo é uma evolução, se a gente ficar com isso que hoje fazemos, para o qual hoje existe um antídoto, seremos superados. Temos que buscar outra forma, outra forma posicional, outra forma de eliminação (da marcação).
Ge: O Real Madrid é o oposto dessa ideia em estrutura. Esse time te seduz pela forma de jogar?
Sampaoli: Nós enfrentamos o Real Madrid com o Sevilla e eles se conhecem muito bem, eles sabem muito bem o que fazer. Não sofre em momento algum, quando estão mal, sempre sabem que vão ter um momento com uma resposta individual que vai terminar prevalecendo. Os jogadores sabem disso, o treinador sabe, a torcida sabe. Todo mundo está esperando por isso. É um time que, inclusive, deixa solto Vinicius, Rodrygo por cima do campo e a equipe se defende com quatro, cinco jogadores e não há nenhum incômodo. Não ficam nervosos. O melhor que tem o Real Madrid é a confiança pela capacidade de seus jogadores. Tem um grande convencimento interno. Eu gosto de outra coisa, outro tipo de futebol. Eu respeito, mas me incomoda até. Outro dia contra o Atlético de Madrid, tiveram uma partida muito pobre e venceram. Deveriam ter perdido, normalmente perderiam. Mas é o Real Madrid. Não se sabe porque, mas o Real Madrid está sempre vivo. É algo mítico.
Ge: Quanto importa, justamente, esse psicológico para um time funcionar?
Sampaoli: É o mais importante a resolver. O psicológico e o externo às vezes têm mais importância para o jogador do que o fator futebolístico dentro do campo. Por isso que nossa luta, enquanto treinador, é que o jogador tenha regularidade de conduta, de imposição no jogo. E nós jogamos dessa forma sempre, sempre. Podemos jogar bem, podemos jogar mal, mas o que aconteceu é que quando você não ganha o jogo, quando perde um jogo, tudo se derruba automaticamente. O jogador começa a não acreditar, o torcedor também não acredita, o dirigente não acredita e se começa a ver inimigos de dentro. Não somente fora. Não são inimigos que têm uma ideia, que tem um treinador de fora, mas os mais perigosos são os inimigos de dentro, mais do que os próprios adversários. Porque diante da pior adversidade deixam de acreditar. Inclusive isso acontece num governo. Se algo deteriora o governo de Lula, vem Bolsonaro. E depois vem Lula. Então não há uma identidade clara. Internamente, só serve ganhar, se você faz uma grande partida e perde alguma coisa vai acontecer.
Ge: Isso hoje muitas vezes nasce nas redes sociais. Como você lida com isso no futebol?
Sampaoli: Eu não tenho redes sociais. Sinceramente, não é para mim. É onde se vê o pior do ser humano, um esgoto social. É horrível. Antes provavelmente éramos assim, mas não havia esses instrumentos para manifestar dessa maneira. O nível de agressão que existe ali é muito violento. E hoje o jogador como não pode ser uma pessoa pública, ele fica ali (na rede social). E nesse lugar se contamina. Se contaminam contra os treinadores, se contaminam contra um companheiro, disputam quem é o melhor entre eles e o clube, a camisa, o escudo ficam de lado. Ou seja, há uma disputa. Por isso eu sempre retorno no espírito amador do sentimento da camisa.
Ge: O futebol te dá mais prazer ou alívio diante desse cenário todo que estamos aqui conversando?
Sampaoli: Primeiro, às vezes eu sofro por todas essas coisas, vendo de dentro. Sofro muito. Mas também por não ter o que preciso. O futebol é como se fosse um vício para mim. Sofro muito para tentar mudar as coisas quando estou dentro, mas quando estou nesse lugar vejo tanta injustiça, tantas coisas, tanto negócio que foi ofuscando o futebol. Isso tudo fica por cima do clube, do sentimento popular, de tanta coisa antes estabelecida. Agora, (o clube) tem um dono. Os donos dos clubes normalmente utilizam um clube como meio de negócios. Os torcedores não são torcedores, são clientes. Então é uma etapa nova e eu sempre quero retornar ao que era. Porque antes era muito mais puro, muito mais nobre, o clube, a camisa, o jogador não estava por cima do escudo do clube.
Ge: O torcedor também paga muito mais caro. Isso contribui para esse cenário?
Sampaoli: Totalmente, ele já chega incomodado no estádio. Porque ele gasta muito dinheiro para estar ali. Ele gosta de ir ao estádio, mas estão incomodados. E há muita gente que quer ir ao jogo e não tem possibilidade, cada vez têm menos possibilidades pelos preços. Então se sentem com o direito de ter exigência desmedida. “Hoje eu venho aqui ver meu time ganhar. Se não ganho, trato de buscar culpados”.
Ge: Você ainda se mantém torcedor de algum clube? Você já disse que era River Plate.
Sampaoli: Não, perdi isso. Era algo que na minha adolescência era o principal. Provavelmente (perdi) pela minha profissão. Sempre acompanho os clubes que trabalhei, desde o Peru, olho jogadores com quem trabalhei, mas perdi isso. Quando eu era criança, sim (torcia para o River). Mas depois perdi, sequer tenho recordações desse tempo. Foi tão forte minha inserção como treinador, tão obsessivo estou no jogo, no futebol que, hoje, sinceramente, não tenho vínculo emocional com ninguém, com nenhuma equipe. Gosto muito dos times por onde passei. O Santos, o Olympique, a La U do Chile, são equipes que ficaram na minha retina… o Sevilla também, sempre assisto. Sigo muito aos jogadores que eu trabalhei, para notar a evolução, por exemplo. Eu sigo muito, por exemplo, a carreira do Gerson. O Pulgar. que agora renovou com o Flamengo, mas eu queria muito que jogasse na Europa. Para mim, eu disse ao Guardiola, ele é como Rodri. Pulgar, posicionalmente, tem muitas coisas interessantíssimas. Estou mais focado nisso do que ir ao estádio. Tomara que eu possa retornar pelos meus filhos pequenos para ver equipes daqui ou de outro local, para que sejam torcedores, mas eu não quero me aproximar disso.
Ge: Em 2011, o Brasil te descobriu com aquela atuação de 4 a 0 da La U contra o Flamengo, no estádio Nilton Santos. Lembra bem desse dia?
Sampaoli: Sim, sim, lembro bem porque naquele Flamengo jogava o Ronaldinho. Ele veio me parabenizar no vestiário depois da partida, disse que se encantou com o nosso time. Nós ganhamos essa Sul-Americana, do início ao fim. Ganhamos do Vasco. E na final da LDU. Era um time muito bom. Como a nossa seleção do Chile também. Uma seleção que mudou a história. Me senti parte de uma equipe que se rebela e que muda a história. Por isso digo que sempre tenho a esperança de chegar num lugar para mudar uma história. Ganhamos a Copa América depois de 100 anos. O Chile nunca tinha vencido a Copa América. Era uma geração de jogadores muito destacados. Era um time que se conhecia de memória. Jogávamos sempre igualzinho. Era um time, não era uma seleção. Todos conheciam o funcionamento do time. Viajávamos para a Europa e levávamos material a cada um deles e eles estavam convencidos de como jogavam. Aranguíz, Vidal, Alexis, Vargas, era um time que se conhecia de cor.
Ge: Hoje, o Brasil tem muitos pontas, mas poucos 9 e 10. Como vê esse processo de formação do Brasil?
Sampaoli: Os talentos seguem aparecendo. Por que tem mais jogadores pelas pontas do que pelo centro? É porque se joga menos futebol. Se corre mais, os jogadores das pontas são os que têm alguma vantagem qualitativa do um contra um. Por dentro a gente não vê jogadores. Inclusive, como Ganso, que é um número 10 que faz jogar todo o time. Não vemos. É uma posição em extinção. Tudo que passa por dentro, que são os jogadores que deveriam ter maior capacidade de jogo, está desaparecendo porque ninguém quer ter a bola. É como se houvesse um medo de ter a bola. É melhor que o adversário a tenha, que aí eu roubo e corro. Tem menos equipes vinculadas ao jogo com a bola.
Ge: Por decisão dos treinadores ou por medo dos jogadores?
Sampaoli: As duas coisas. Por decisão do treinador, porque sabe que o jogador que tem a bola está muito mais perto do erro do que do acerto. Então diz: não queremos a bola.
Ge: Os melhores 10 do Brasil recente são argentinos e uruguaios, quase sempre. Você vê isso pela importação crescente ou acredita que a formação seja mais voltada para isso nesses países?
Sampaoli: Eu acho que passa pela maneira como se forma. O que faz um jogador com a capacidade de número 10, que tenha habilidade de ter vantagem por dentro. Por isso citei Ganso. Quando fui a Sevilla o primeiro jogador que pensei foi ele. A 10 é a camisa mais valorizada do futebol brasileiro, pelos nomes de toda sua história. Perder o talento por dentro é perder muita coisa. Mas acho que hoje se exige mais raça do que futebol.
Ge: Por que Ganso não jogou tanto no Sevilla?
Sampaoli: Eu acho que por responsabilidade compartilhada. Eu tinha a expectativa de que ele fosse o melhor jogador da Espanha. E eu o forcei muito. Ele teve muitos bons jogos, inclusive depois que saí com Berizzo. Começou muito bem. Se posso criticar alguma coisa é que não fiquei mais próximo dele para essa evolução. Não dei a ele o protagonismo que merecia.
Ge: Você se sentiu bem recebido aqui no Brasil como treinador? Aqui há um debate muito grande de treinadores brasileiros sobre o excesso de técnicos de fora no país.
Sampaoli: Eu acho que fui o primeiro aqui, na verdade. O primeiro estrangeiro a ir bem no Brasil fui eu, no Santos. Antes, nenhum técnico estrangeiro foi muito bem aqui. Quando acontece algo assim acho que abre portas para que os dirigentes chamem outros. Eu acho que é bom para os treinadores brasileiros essa competição. Porque fazem melhorar. Com certeza vão aparecer, como já tem aparecido.
Ge: Quando você foi campeão da América no Chile um jornalista te perguntou se você era feliz com essa conquista. E você respondeu que era mais feliz em Casilda, sua cidade natal. Você tem esse sentimento muitas vezes?
Sampaoli: Muitas vezes sim, nós ganhamos a Copa América, que era muito importante para o Chile, mas eu valorizei muito mais o desenvolvimento do que passamos. Eu valorizo como conseguimos o objetivo. Se pode conseguir de diversas maneiras. Ou como fizemos na Copa do Brasil pelo Flamengo. Para mim, fomos a melhor equipe da Copa do Brasil, a que perdemos para o São Paulo. Mas o que me doeu foi que a nossa própria gente esperava que a gente perdesse, isso sim me incomoda. Quando alguém duvida do projeto. Quando ganhamos. Tivemos algumas complicações, mas a felicidade para mim passa por outro lado. Eu sou um profissional e me coloco mais contente pelos jogadores, pela torcida do que por mim. Eu não me reprovo muitas vezes e tampouco me coloco num pedestal porque ganhei um torneio.
Fonte: ge esportes